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Referência: LEFFA, V. J.; COSTA, R. A. ; BEVILÁQUA, A. F. O prazer da autoria na elaboração de materiais didáticos para o ensino de línguas. In: FINARDI, K. R.; TÍLIO, R.; BORGES, V.; DELLAGNELO, A.; RAMOS FILHO, E.. (Org.). Transitando e transpondo n(a) Linguística Aplicada. Campinas: Pontes, 2019, p. 267-297.
O prazer da autoria na elaboração de materiais didáticos para o ensino de línguas
Vilson J. Leffa (UFPEL, CNPq)
Alan Ricardo Costa (UNISC, CAPES)
André Firpo Beviláqua (UFPEL, UFSM)
1. Introdução
A produção de material didático feita pelo professor tem sido uma preocupação constante dos cursos de formação de docentes de línguas, desde os tempos imemoriais do mimeógrafo a álcool, com o professor multiplicando folhas de exercícios para distribuir aos alunos na sala de aula, até a época da aprendizagem móvel, quando trocamos o suporte da folha impressa pelo suporte eletrônico do smartphone e ampliamos a aprendizagem para fora da sala de aula. A preparação do material didático ao longo dessas décadas tem também exigido do professor um investimento adicional em novos saberes, que estão sempre mudando, e um adicional de tempo disponível, que permanece sempre escasso ao longo do tempo. A dificuldade de capitalizar sobre os conhecimentos já adquiridos e o desafio de gerenciar a exiguidade do tempo disponível, entre outros elementos, podem ser vistos como aspectos negativos da produção de materiais didáticos pelo professor. Há, porém, aspectos positivos que também precisam ser considerados, incluindo aí os benefícios que a autoria dos próprios materiais pode trazer não só para a aprendizagem do aluno, mas também para o trabalho do professor. Os desafios que alguns veem como dificuldades que sobrecarregam o professor com mais compromissos podem ser vistos por outros como oportunidades de autorrealização, oferecendo a possibilidade de culminar no prazer da autoria.
A literatura é bastante vasta sobre as desvantagens de o professor ser o autor dos próprios materiais, iniciando pela crença da necessidade de uma divisão de trabalho entre docência e autoria de materiais: a preparação de materiais didáticos exige um conhecimento que o professor não possui e, por isso, deve ser deixado para o especialista. A antiga separação que se fazia entre professor e pesquisador (FERREIRO, 2001), em que se criticava o amadorismo da pesquisa feita pelo professor, é trazida agora para desqualificar o material que ele venha a produzir para seus alunos. Nessa visão, cabe ao professor ensinar; ao pesquisador, pesquisar; e ao produtor de materiais, produzir os materiais.
Entre os diversos aspectos negativos do material produzido pelo professor, o mais citado é sua baixa qualidade (HOWARD; MAJOR, 2004). Os materiais produzidos para consumo próprio correm o risco de não apresentar uma sequência lógica, na medida em que não possuem um princípio orientador. Os materiais “caseiros” são produzidos de acordo com as necessidades e interesses do momento, fragmentando-se ao longo do curso em unidades independentes, sem concatenação entre si, demonstrando falta de rumo e de uma progressão adequada (BLOCK, 1991; HARMER, 2001); o que pode frustrar e confundir alguns alunos que não veem progresso na aprendizagem da língua. Os materiais podem também conter erros gramaticais, instruções confusas, design singelo, seleção de textos pedagogicamente incorretos para os alunos, às vezes até a perpetuação de diferentes tipos de preconceitos que passam desapercebidos pelo professor. Além da falta de qualidade do material produzido, há ainda um outro aspecto negativo, de ordem mais prática, que é a falta de tempo. Nas palavras de Howard e Major (2004, p. 103):
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Talvez um fator chave que impede muitos professores de produzir seus próprios materiais de ensino seja o tempo. Independentemente da intensidade com que alguém acredite nas vantagens do material produzido pelo professor, a verdade é que para muitos isso simplesmente não é viável, pelo menos de modo permanente.
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Em que pese esses aspectos negativos, o levantamento da literatura mostra um destaque maior para o que há de positivo, com ênfase na possibilidade de contextualização do ensino, individualização, personalização e uso adequado do imprevisível como recurso para enriquecer a aprendizagem (BLOCK, 1991; HARMER, 2001; HOWARD; MAJOR, 2004; HARWOOD, 2010; LOPERA, 2015), aspectos que incorporam a capacidade de atender às necessidades e interesses da comunidade, dos alunos e do momento vivido.
Um aspecto positivo não destacado na literatura é o prazer do professor na produção de seu próprio material de ensino, que pode contribuir para o desenvolvimento e manutenção de um ambiente saudável na sala de aula. O professor sente a satisfação da autoria ao ver o aluno envolvido na atividade que ele elaborou; o aluno, por sua vez, sente-se prestigiado por ver que o professor preparou o material especificamente para ele. A questão da falta de tempo do professor continua sendo um problema sério, mas com possibilidade de ser resolvida pela adoção de uma filosofia de colaboração em massa. Finalmente, o problema dos custos de produção pode também ser resolvido pela transformação dos materiais produzidos pelo professor em Recursos Educacionais Abertos (REAs), disponibilizados em domínio público. A expansão dos REAs, embasada nesses dois princípios, colaboração em massa e domínio público, promete levar o ensino e a aprendizagem nessa direção; o que antes era uma utopia de visionários tem agora uma brecha para se tornar realidade. Como fazer isso – valorizando o professor, melhorando a educação e principalmente mostrando como a produção de materiais pode ser prazerosa – é o que pretendemos demonstrar neste capítulo, começando pelo conceito de REA.
1. Pressupostos Teóricos
O objetivo desta seção é explicar o que é um REA, mostrando suas origens, seu impacto atual para a educação e a revolução que sugere para o futuro. Partimos do pressuposto de que o REA tem sua origem no Objeto de Aprendizagem, visto como uma peça de montar em um Lego, que permite várias combinações, produz diferentes resultados e que acabou evoluindo para o que entendemos atualmente como REA. Tentamos, na sequência, explicar o que é um REA, visto como um composto de três conceitos básicos: (1) recurso, como meio que leva a um determinado fim; (2) educacional, como um elemento adicionado ao recurso que implica uma ação do aluno; (3) abertura, incluindo aspectos como facilidade de acesso à informação e a capacidade de se transformar, para melhor se adaptar às necessidades e interesses dos alunos. Em suma, REA é um Recurso que é Educacional e que é Aberto (LEFFA, 2016).
1.1 De objeto a recurso
O REA evoluiu do Objeto de Aprendizagem (OA), com o qual às vezes se confunde pelas semelhanças, mas do qual também se separa, devido a diferenças substanciais. Vejamos inicialmente as semelhanças, começando com uma das definições mais conhecidas e tradicionais de OA, que é a do Programa de Extensão da Universidade de Wisconsin, com base em Hodgins (2002), que define OA como:
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Pequena unidade eletrônica de informação educacional que se caracteriza por ser flexível, reusável, customizável, interoperável, recuperável, capaz de facilitar a aprendizagem baseada nas competências e de aumentar o valor do conteúdo (WISC-ONLINE, 2005).
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A aprendizagem construída com OAs é baseada na metáfora do Lego, aquele jogo infantil em que os mais diferentes brinquedos – bonecos, animais, objetos – são montados a partir de pequenos blocos, encaixados uns aos outros, com infinitas possibilidades, limitadas apenas pela imaginação da criança. No contexto educacional, os blocos são objetos de aprendizagem que se ajustam uns aos outros para formar diferentes cursos com inúmeras possibilidades de diferentes combinações. A ideia é que a facilidade com que esses blocos são desmontados e recombinados em diferentes cursos viabiliza não só a reutilização, baixando os custos, mas também a flexibilidade, de modo a atender às necessidades e interesses do aluno por meio da customização. Ainda, de acordo com o Programa de Extensão da Universidade de Wisconsin, o OA caracteriza-se por oferecer: (1) a quantidade certa de conteúdo, na medida em que permite ao professor selecionar do repositório disponível apenas os OA que precisa; (2) economia de tempo, com mecanismos de busca que acessem rapidamente o conteúdo procurado; (3) customização, permitindo que cursos sejam rapidamente montados para uma organização ou mesmo para um indivíduo; (4) autossuficiência, em que o uso de um OA não depende da existência de outros; (5) reutilização, viabilizando o uso de um único OA para diferentes contextos e objetivos; (6) agregação, permitindo que um OA possa ser incorporado em uma coleção maior de conteúdo, incluindo atividades, unidades ou disciplinas de cursos tradicionais; (7) uso de metadados, trazendo informações descritivas sobre o OA, de modo que ele possa facilmente ser recuperado por mecanismos de busca. Os Oen se caracterizam por serem flexíveis, portáteis e adaptáveis, com possibilidade de serem usados em diferentes ambientes de aprendizagem e até em diferentes disciplinas (WISC-ONLINE, 2005).
As diferenças entre REA e OA surgem quando se percebe que os OA voltam-se, quase exclusivamente, para questões de ordem técnica, como o armazenamento, recuperação e reutilização dos objetos, relegando a um segundo plano, ou mesmo ignorando, o suporte teórico e pedagógico aos objetos elaborados (PETERS, 2003; NURMI; JAAKKOLA, 2005; LEFFA, 2006). Esse recuo teórico dos OA, às vezes, é também associado à ideia de que eles podem ser vistos como pedagogicamente neutros, o que, por um lado, seria vantajoso, na medida em que favoreceria a reutilização dos objetos em diferentes contextos (WILEY, 1999), mas, por outro, traria muitos questionamentos, reacendendo críticas ao instrucionismo e a pedagogia tecnicista (SABBATINI, 2012). Pode-se também argumentar que aquilo que estaria sendo passado como pedagogicamente neutro estaria na realidade encobrindo uma outra ideologia, postura que é reforçada pela associação que se faz entre as propostas de uso dos OA por grandes corporações (SCHMIDT, 2005), e que inclui também a preferência pela utilização dos OA em cursos oferecidos pelas forças armadas (FRIESEN, 2004; VERBERT; DUVAL, 2008). Conforme Friesen (2004), um OA que pudesse ser apresentado como pedagogicamente neutro seria pedagogicamente irrelevante.
A proposta dos REA, nessa perspectiva, resgata o prestígio dos OA, dando aos objetos a fundamentação pedagógica que lhes falta, com base na filosofia de uma educação aberta e colaborativa. As barreiras tradicionais da educação, construídas na constatação da carência generalizada – sejam a falta de recursos financeiros, a formação incompleta dos professores ou a dificuldade de acesso à informação – poderiam ser vencidas por uma educação aberta, com base na afluência dos recursos digitais, que está rapidamente se propagando por todas as camadas da sociedade e viabilizando alternativas até então impensáveis, como os fenômenos do crowdsourcing ou o da colaboração em massa (TAPSCOTT; WILLIAMS, 2006).
A evolução de OA para REA foi rápida. David Wiley, um dos pioneiros dos OA, tornou-se logo um dos principais propagadores dos REAs, redefinindo os 4 Rs iniciais da educação aberta, de modo a conceder ao usuário o direito de: (1) reusar o conteúdo em diferentes contextos, seja um grupo de estudo, um site da web ou uma vídeo-aula, entre outros; (2) revisar o conteúdo, fazendo adaptações, ajustando, modificando, traduzindo etc.; (3) remixar o conteúdo com outros materiais criando um novo conteúdo; (4) redistribuir o conteúdo, na versão original ou com as modificações feitas (WILEY, 2007). Mais tarde, Wiley (2014, s.p.) acrescentou um quinto R, o direito de reter o conteúdo, entendendo por reter, conforme o autor, “o direito de fazer, possuir e controlar cópias do conteúdo (ex.: fazer download, duplicar, armazenar e gerir)”. Não fica claro, na leitura do texto de Wiley, a contribuição que esse quinto R traria, já que estaria incluído em outras licenças, como a de reusar e redistribuir. Pelas ideias que defende e pelo que faz na prática, Wiley tem, na verdade, contribuído bastante para a divulgação dos REA, mas, sua insistência no prefixo “re”, incluído nos cinco Rs, essencialmente designativo de algo que se repete ou retroage, deixa, em nossa visão, o REA ainda muito preso ao passado, arraigado no conceito de OA. REA é essencialmente abertura, que não existia nos OA. Reusar, revisar, remixar, redistribuir e principalmente reter, são palavras que pouco contribuem para passar essa ideia de abertura. Wiley parece ver mais as semelhanças do que as diferenças entre REA e OA. Nas seções seguintes, vamos redefinir os REAs, mostrando principalmente as diferenças.
1.2 A importância de ser recurso
A primeira mudança significativa que se observa quando se passa de REA para OA é a substituição da palavra “objeto” por “recurso”. Vemos objeto como um termo inadequado pela sua ambiguidade, sendo ao mesmo tempo meio e fim, duas noções que não podem ser confundidas. Na expressão “objeto de aprendizagem”, por exemplo, podemos entender “objeto” como um meio físico para se chegar a um objetivo, ou o próprio objetivo. O livro que o aluno usa para aprender espanhol pode ser visto como objeto de aprendizagem, como meio para aprender espanhol. Por outro lado, a língua espanhola também pode ser vista como objeto de estudo para o aluno, ou seja, em última análise, como objeto de aprendizagem. Tanto o livro que o aluno usa para aprender espanhol, como a própria língua espanhola, que ele estuda, seriam ambos objetos de aprendizagem. Esta fusão entre meio e fim apaga uma diferença importante em qualquer atividade humana, incluindo a educação, e acaba não esclarecendo o que deve ser entendido como objeto de aprendizagem.
Já o uso da palavra “recurso” afasta essa ambiguidade com o objeto, deixando claro que se trata de um meio para se chegar a um objetivo e não o próprio objetivo. Traz uma base teórica robusta fundamentada na Teoria da Atividade (COLE, 2003; DANIELS, 2003; ENGESTROM; MIETTINEN; PUNAMAKI, 1999; LEONTIEV, 1981; VYGOTSKY, 1981; WERTSCH, 1998), que define recurso como um instrumento que se põe entre o sujeito e o objeto, produzindo um resultado. Em outras palavras, trata-se de um artefato cultural, que empodera o sujeito, viabilizando e ampliando sua ação. Entre os artefatos que ampliam a ação, podemos destacar as ferramentas do dia-a-dia, como o martelo, a caneta, o livro, o computador, a rede social, o algoritmo da matemática para resolver uma conta de multiplicação, a própria língua; e podemos também incluir aqueles artefatos que recuperam funções comprometidas de órgãos do corpo, como os óculos para melhorar a visão, a bengala para caminhar com mais firmeza ou o marca-passo para manter a atividade rítmica do coração. Na medida em que esses artefatos fundem-se às partes do corpo, transformando-se em órgãos únicos, formam o que Kaptelinin (1996) chama de órgão funcional, preservando a atividade social e individual do sujeito.
Encontramos na ação humana inúmeros exemplos do uso do recurso como ferramenta capaz de empoderar o sujeito que o domina, tanto física como intelectualmente (LEFFA, 2016). Quem usa um martelo, dirige um automóvel ou manuseia um computador pode mais do que aquele que não sabe usar esses recursos. Um aspecto fundamental da evolução humana está não apenas na necessidade imposta a cada geração de adquirir o domínio das ferramentas que herdou da geração anterior, mas também na obrigação de aprimorar essas ferramentas para a geração seguinte. As ferramentas, para o bem ou para o mal, serão cada vez mais poderosas e, pelo que já vimos, farão com que cada geração saiba mais, possa mais e viva mais do que a geração anterior.
Os seres humanos se empoderam porque são afetados pelos artefatos que criam, na medida em que esses artefatos, transformados em ferramentas, produzem mudanças no corpo e na mente (NEWMAN, F.; HOLZMAN, 1993; VYGOTSKY, 1993). Muitos desses artefatos são desenvolvidos não só por humanos, mas também pela ajuda de outros artefatos, como os robôs em linhas de montagem, o que pode levar a máquina a adquirir agência própria e atuar como seres humanos em determinados contextos, criando duas possibilidades para a humanidade: (1) um cenário mais sombrio, em que as máquinas estariam agindo contra os humanos, efetuando domínio da criatura sobre o criador, ou (2) um cenário mais iluminado, em que os humanos estariam agindo com a máquina, sugerindo uma isonomia de forças entre criador e criatura. É provável que tudo fique misturado, com a agência distribuída entre humanos e máquinas (COOREN, 2004; LEFFA, 2013), o que já se percebe em práticas emergentes como a Internet das Coisas, com o apoio teórico de abordagens como a Teoria Ator-Rede (LATOUR, 2005). REA como recurso educacional fortalece a ideia de empoderamento. Na perspectiva da filosofia dos REAs, é razoável pressupor que o professor pode mais quando tem a oportunidade de produzir seus próprios materiais para atender seus alunos em seu contexto específico de aprendizagem; como é razoável também pressupor que o aluno pode mais quando é atendido em suas necessidades e interesses.
1.3 A importância de ser educacional
A segunda mudança é a substituição da palavra “aprendizagem” por educação. Onde tínhamos “objetos de aprendizagem”, temos agora “recursos educacionais”. O termo educacional cobre uma área semântica maior, envolvendo não apenas a aprendizagem do aluno, mas também o ensino do professor e o contexto em que ambos, ensino e aprendizagem, ocorrem. Para dar conta de todos esses componentes, propomos olhar o aspecto educacional do REA a partir de uma metáfora com base na dramaturgia, envolvendo o que vamos chamar de cenário, atores e ação, mas vistos aqui como um sistema de atividades (ENGESTROM; MIETTINEN; PUNAMAKI, 1999; COLE, 2003), com suas normas, divisão de trabalho e compartilhamento de objetivos.
Cenário, atores e ação envolvem, respectivamente, três perguntas que precisam ser respondidas pelo professor quando inicia a tarefa de produzir ou adaptar o material a ser apresentado para seus alunos: (1) onde estou? (2) com quem estou? e (3) o que está acontecendo? O cenário (onde estou?) leva em conta a preocupação em atender aos interesses da instituição e da comunidade, considerando também os recursos oferecidos; considerando o ensino do espanhol, uma escola em zona de fronteira tem necessidades e interesses diferentes de uma escola em uma cidade de tradição turística, implicando o uso de materiais diferentes. Os atores (com quem estou?) leva em conta a personalização e envolve principalmente a preocupação em atender as necessidades e interesses dos alunos. Às vezes, pode ser necessário adaptar o material ao nível linguístico do aluno; outras vezes a atender interesses específicos de uma turma. Finalmente, considerando a ação (o que está acontecendo?), o professor leva em conta o momento histórico vivido pelo aluno, dando à aula um “toque pessoal” e ao conhecimento produzido ali, um toque “local”. Pode ser um evento local ou um tema de grande impacto para os alunos que venha a surgir de modo inesperado ao longo do ano escolar, e que só é possível de incorporar adequadamente ao currículo, se o professor tem a autoria dos materiais. A possível fragmentação e falta de progressão no desenvolvimento do curso, visto como defeito acima, é uma questão de relevância a ser julgada pelo professor; às vezes pode ser mais interessante improvisar do que manter a rotina prevista para o curso. Podemos ver a língua como um recurso flexível, quase camaleônico, que se adapta com facilidade a diferentes temas, viabilizando o atendimento aos interesses dos alunos quando o professor produz o que usa com eles, ao contrário, por exemplo, do que acontece quando material é produzido para o mercado global. Concluindo, é também razoável interpretar algumas críticas negativas contra a autoria de materiais pelo professor como parte de um jogo de interesses que se estende para além de questões pedagógicas, incluindo aspectos de natureza política e econômica de falta de interesse em valorizar e empoderar os professores.
1.3 A importância de ser aberto
A abertura de um recurso educacional está embasada nos conceitos de acesso proporcionado pelo REA em relação ao público, permitindo conexão sem restrições de uso, e na disponibilidade de transformação do recurso em relação a si mesmo, permitindo adaptações a diferentes contextos de uso para melhor atender às necessidades e interesses dos usuários. O acesso tem a ver, portanto, com a disponibilidade do recurso ao público, com o rompimento de diferentes tipos de barreiras, sejam de natureza tecnológica, financeira ou geográfica (LEFFA, 2016), nos termos do que se entende por educação aberta (AMIEL, 2012; COSTA; LEFFA, 2017; BEVILÁQUA et al., 2017). Já a ideia de transformação tem a ver com a capacidade do recurso de ser modificado pelo usuário, usando os conceitos de customização e personalização (KAY, 2001; KOBSA; KOENEMANN; POHL, 2001; HSIEH; CHEN, 2016; SCHADE, 2016); um livro didático, por exemplo, nos termos usados aqui, é um recurso fechado, na medida em que, uma vez impresso, não pode ser mais modificado pelo professor ou pelo aluno. Tanto em relação ao público como a si mesmo, o grau de abertura de um recurso varia de totalmente fechado a totalmente aberto.
Os REAs fazem parte de um movimento maior conhecido como “Educação Aberta”, descrito por Litto (2006; 2008) como uma ruptura social igual à invenção da imprensa no séc. XV ou como a introdução do ensino público na França no séc. XVIII. Segundo ele, estamos no início de uma nova era, facilitada pelos avanços da tecnologia, que nos tira de uma sociedade de escassez para entrar numa sociedade de abundância de ideias e saberes. Concordamos com Litto, mas também achamos que não podemos ser ingênuos a ponto de acreditar que temos acesso a toda informação que desejamos. Além das barreiras tecnológicas, financeiras e geográficas, temos também as barreiras de retenção de direitos, com reserva de privilégios e acesso restrito às informações, muitas vezes retidas em benefício de algumas classes privilegiadas. A boa notícia é que as Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC) têm aberto algumas brechas também nessas barreiras de retenção, seja por meio da criação de licenças abertas, do tipo Creative Commons (BEVILÁQUA et al., 2017), ou mesmo pelo vazamento de informações sigilosas, como aconteceu no episódio Snowden (GLOBAL, 2013).
Se, por um lado, as tecnologias digitais servem para armazenar e ocultar informações, por outro, elas também propiciam uma abertura de acesso às informações ainda não vista até hoje na história da humanidade. Contribui para essa abertura tecnológica a sofisticação dos artefatos digitais produzidos, tanto em termos de hardware como de software. Em termos de hardware, temos processadores cada vez mais velozes, com maior capacidade de armazenamento e ocupando menos espaço físico, desde o primeiro computador comercial, lançado em 1951, que pesava mais de 7 toneladas e ocupava uma sala inteira (UNIVAC, 2012). Sabemos, já desde 2011, que a soma de todo o poder computacional usado pela NASA em 1969 (SARAN, 2009) para levar o homem à lua era menor do que a capacidade de processamento de um smartphone (KAKU, 2011). Hoje sabemos também que nenhum supercomputador, produzido para pesquisas antes de 1990, chega a um quinto da capacidade de processamento de um smartphone (NICK, 2014). Essa evolução mostra que, em termos de hardware, um adolescente em 2018 leva no bolso mais poder computacional do que um centro de pesquisa na década de 1980.
Em termos de software, a abertura tecnológica se realiza pela capacidade de transformar bits de baixo nível em linguagens computacionais requintadas, com recursos de som e imagem, o que facilita a interação com o usuário. O que antes era restrito às grandes empresas e centros de pesquisa, exigindo o uso de linguagens computacionais extremamente herméticas, com comandos perfurados em cartões de leitura, agora está aberto ao grande público, em linguagens intuitivas, tanto verbais como visuais, executadas por comandos escritos ou pronunciados em voz alta. Um número maior de pessoas pode usar os recursos digitais, virtuais ou computacionais para suas necessidades diárias de trabalho, atividades relacionadas à educação ou momentos de lazer. O avanço da tecnologia, fundindo adequadamente os recursos de hardware com os requisitos de software, aumenta a usabilidade dos aplicativos, tornando-os mais abertos, na medida em que elimina as dificuldades de manusear diferentes dispositivos, incluindo aí, por exemplo, a adoção de técnicas web-responsivas que se adaptam ao usuário sem esperar que o usuário se adapte a elas.
O rompimento das barreiras financeiras tem a ver, pelo menos, com três aspectos que envolvem o acesso aos REAs: suporte, custos de produção e direitos autorais. Desses, o mais difícil de resolver é o suporte: o REA, para ser usado pelo aluno, precisa ser instanciado em algum suporte, seja o papel ou a tela de algum dispositivo digital. Desses dois, papel versus tela, o mais acessível é o suporte digital, principalmente o smartphone, já há muito considerado a mais inclusiva das tecnologias (LEFFA, 2016). Acreditamos que, em termos de acesso à informação e desenvolvimento da aprendizagem, considerando a relação custo/benefício, nada pode ser financeiramente mais acessível do que um smartphone. O livro impresso em papel ainda é um suporte que deve ser considerado e não pode ser descartado, mas é o mais dispendioso dos dois suportes. O que no smartphone funciona com a leveza da luz, a um nível de custo que beira a gratuidade, no papel impresso envolve custos maiores de produção e transporte, às vezes envolvendo também problemas de distribuição. Resta a questão dos custos em direitos autorais, que pode ser resolvida com a adoção de uma política de licenças Creative Commons, que permite a cópia, redistribuição, edição e remixagem do conteúdo criado, sem infringir a legislação dos direitos de autor (BEVILÁQUA et al., 2017). A filosofia básica dos REAs é a de domínio público, sem qualquer restrição financeira, de modo a propiciar acesso livre ao seu conteúdo.
Finalmente, os REAs, caracterizam-se também pelo objetivo de romper as barreiras geográficas, não só em termos de longas distâncias – de um país a outro, de regiões metropolitanas para áreas rurais – mas também em termos de espaços diferenciados. O que era restrito à sala de aula agora se expande para a sala de jantar, para o quarto de dormir, talvez para a sala de espera, para a fila do banco, ou mesmo para a trilha do parque, gerando uma espécie de hibridização desses espaços pelo desvio de suas finalidades. Caminha-se pela calçada, falando ao smartphone e gravando mensagens para amigos distantes ou lembretes do que precisa ser feito mais tarde, alterando não apenas as relações espaciais, com a interação a distância, mas também as relações temporais, com interações assíncronas. A abertura para outros espaços de aprendizagem não só propicia, mas também impõe condições que precisam ser observadas para que a aprendizagem ocorra.
O rompimento das barreiras tecnológicas, financeiras e geográficas reflete abertura dos REAs para fora, em relação ao público a que se dirige. Os REAs, no entanto, não podem ser apenas blocos monolíticos oferecidos ao aluno para que ele deles construa seu saber; precisam ser também abertos para dentro, permitindo transformações internas em sua estrutura e conteúdo, para que possa atender aos interesses e necessidades de um determinado aluno em seu contexto específico de aprendizagem. É aí que entra o trabalho do professor, não apenas como docente, mas também como autor, preferencialmente trabalhando com outros professores de modo colaborativo, em coautoria (COSTA; LEFFA, 2017).
2. Metodologia
Trata-se de uma investigação de natureza qualitativa, com ênfase no paradigma indiciário (GINZBURG, 2003), que pode ser caracterizado como um estudo baseado em pistas e indícios coletados indiretamente e não em depoimentos tomados dos sujeitos com perguntas diretas sobre o que se procura investigar. Reúnem-se, para isso, os dados coletados de cinco cursos de formação continuada de professores, ministrados pelos três autores entre 2015 e 2017, na modalidade a distância, tendo como foco específico a produção de materiais didáticos para o ensino de línguas.
A característica principal desse grupo maior, oriundo dos cinco grupos, é a diversidade, incluindo, entre outros aspectos: (1) professores de línguas de todas as regiões do Brasil; (2) docentes de inglês, espanhol, francês e japonês, como línguas estrangeiras, e português, como língua estrangeira e materna; (3) nível diferenciado de escolarização, incluindo professores com graduação, mestrado e doutorado; (4) nível diferenciado de experiência no ensino da língua, incluindo iniciantes e professores com mais de 15 anos de prática em sala de aula; (5) ensino de línguas em escolas públicas, particulares e centros de línguas; (6) domínio diferenciado da língua, da metodologia de ensino e da tecnologia. São ao todo cerca de 100 professores que, pela sua diversidade, formam uma amostra que pode ser considerada representativa do universo dos professores de línguas do Brasil interessados na produção de materiais didáticos, ainda que este estudo, pelo seu caráter qualitativo, não se encaixe em uma perspectiva estatística. Esses professores serão referidos aqui como cursistas.
Os instrumentos usados para a geração dos dados foram sites de redes sociais, aplicativos de mensagens instantâneas, fóruns de discussão, sessões de demonstração e relatórios de desempenho dos cursistas, que produziram um corpus de 597 páginas de texto e imagens, além de inúmeros vídeos e atividades criadas pelos cursistas no sistema de autoria ELO (Ensino de Línguas Online), disponível em < http://www.elo.pro.br/cloud/ >. Foi nesse corpus que se buscaram os indícios do prazer da autoria de materiais didáticos.
3. Análise
Embora os cinco cursos ministrados pelos autores tenham produzido vários tipos de dados, incluindo não só os oriundos do processo de elaboração dos materiais, mas também os dados relacionados ao resultado final, que são os materiais didáticos produzidos pelos cursistas, o foco deste trabalho está voltado ao processo da criação, com ênfase no que está definido aqui como o prazer de criar. Buscam-se exemplos de dados que foram produzidos pelos professores nos fóruns, grupos de discussão e relatórios de desempenho produzidos automaticamente pelo ELO, acrescidos de depoimentos opcionais que podem ser feitos pelos usuários. Na medida em que o material didático, depois de produzido, compartilhado e comentado, muitas vezes volta para modificações e reparos com base nas sugestões dadas pelos colegas, fica difícil fazer a separação entre processo e produto, motivo pelo qual também incluímos essas fases finais de elaboração em nossa análise. Vamos, portanto, buscar sinais de prazer desde a expectativa da produção do material didático até a observação dos resultados obtidos.
Vemos o prazer da autoria como a produção de um artefato que gere minimamente a satisfação de um desejo do autor e que atinja sua plenitude quando satisfaz também o desejo do outro, aquele para quem o artefato é produzido. O desejo do autor pode ser o de ter sua criatividade e competência reconhecida e o do outro de satisfazer uma necessidade, interesse ou mesmo uma determinada emoção. O prazer do autor é, portanto, maior quando percebe que atendeu ao desejo do outro: é o caso, por exemplo, do dramaturgo que ouve o silêncio emocionado da plateia atenta a cada sussurro do ator que recita sua peça; do jogador diante do aplauso do público com o gol de placa que acaba de marcar; do professor quando percebe a alegria do aluno em fazer a atividade que ele preparou. Trata-se de um prazer que extravasa não só os limites do sujeito – indo até o outro, seja a plateia do teatro, o público do estádio ou o aluno na sala de aula – mas que extravasa também os limites dos sentidos – tato, paladar, olfato, audição ou visão – para alcançar um efeito maior, envolvendo, dentro do sujeito, os processos psicológicos superiores, e, fora dele, a interação com o outro. É nessa perspectiva mais ampla, fundamentalmente vygotskyana, que propomos o prazer da autoria. O REA produzido pelo professor para seus alunos, fica também aberto para uso de seus colegas, que podem remixá-lo e redistribuí-lo para outros colegas, criando redes que ampliam a ação do professor e podem formar maneiras mais prazerosas de trabalhar, com ênfase na colaboração e no compartilhamento das tarefas, ampliando o reconhecimento do professor/autor.
3.1 As categorias de análise
Não se busca analisar tudo o que foi discutido nos dados coletados que compõem o corpus, mas procurar nesse corpus traços e sinais (GINSBURG, 2003), que indiquem de maneira convincente aquilo que estamos chamando de prazer da autoria. Para isso foram sugeridas algumas categorias iniciais, que foram depois testadas em várias buscas no corpus e refinadas até se chegar às quatro categorias finais, assim definidas: (1) a descoberta do objeto; (2) a descoberta da ferramenta; (3) a descoberta do outro; e (4) a descoberta do sucesso.
Essas categorias são resumidas em 4 quadros, cada um com 10 depoimentos, coletados de um universo de centenas. Esses depoimentos provêm dos fóruns, grupos de discussão e dos relatórios de desempenho dos cursistas, reunindo os comentários que eles voluntariamente incluíram na conclusão de cada atividade testada. As transcrições, que apresentavam poucos problemas de correção gramatical, são todas literais, com raras exceções, entre elas: (1) correção de problemas de ortografia, e (2) substituição das palavras “módulo” e “disciplina” pela palavra “curso”, de compreensão mais fácil fora do contexto em que foram usadas pelos cursistas. Palavras entre colchetes [] foram acrescentadas para esclarecimentos. Tudo o que não contribui para a compreensão do que está sendo descrito, incluindo a autoria dos depoimentos, foi retirado; alguns poucos nomes que aparecem, mantidos para não quebrar a leitura dos depoimentos, são pseudônimos. Às vezes, por questões de estilo, usamos, na parte da análise, a palavra “atividade” como sinônimo de REA, principalmente no plural, substituindo, quando possível, o que nos parece canhestro, “os REAs”, por algo mais adequado ao espírito da língua, “as atividades”.
3.2 A descoberta do objeto
A descoberta do objeto, visto como o conteúdo a ser desenvolvido, ocorre no primeiro momento do curso, quando os cursistas fazem o primeiro contato com os tipos de REA que eles deverão produzir, fazendo um tour pelas atividades elaboradas pelos seus colegas em cursos anteriores. A finalidade desse momento, mais do que descrever em palavras o objetivo do curso, é mostrar exemplos de atividades prontas, na expectativa de deixar mais claro para o cursista o que se pretende que eles façam no curso. O Quadro 1 mostra 10 dessas primeiras reações, com depoimentos coletados principalmente dos relatórios de desempenho, evidenciando o que a nosso ver são indícios de expectativas de prazer em produzir o que está sendo demonstrado, como uma preliminar, trailer ou prelúdio do que eles próprios estarão realizando mais adiante.
Quadro 1 – Dez depoimentos sobre o prazer da descoberta do objeto
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Fonte: os autores com base nos depoimentos dos cursistas
3.3 A descoberta da ferramenta
Depois de conhecer o objeto do curso, representado pelas atividades demonstradas aos cursistas, apresenta-se a ferramenta que foi usada para a produção dessas atividades, o sistema de autoria ELO. Embora a metodologia tenha variado nos detalhes entre os cinco cursos, oferecidos pelos três autores em diferentes momentos, a ideia básica da necessidade de se conhecer a ferramenta permaneceu de um curso para outro. Em relação ao primeiro autor, responsável por três dos cinco cursos listados, houve também a preocupação de incluir, com o devido cuidado de não ferir suscetibilidades, um pouco de humor, adotando, assim, para a introdução do ELO, o título de “Conhecendo a ferramenta de seus sonhos”. É possível argumentar que esse tipo de abordagem tenha contribuído para induzir os cursistas a postarem comentários elogiosos em relação ao curso, mas preferimos ver aí algo maior, como a criação de um ambiente favorável de aprendizagem, na base das relações dos cursistas entre si e com o professor, dos quais os elogios são apenas indícios. Por outro lado, há também críticas, como veremos mais adiante no Quadro 5.
Quadro 2 – Dez depoimentos sobre o prazer da descoberta da ferramenta
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Fonte: os autores com base nos depoimentos dos cursistas
3.4 A descoberta do outro
A descoberta do outro, a nosso ver, emergiu da constatação de que, apesar da diversidade do grupo, estavam “todos no mesmo barco”, compartilhando um objetivo comum, que era a produção das atividades didáticas, e usando para isso a mesma ferramenta. O resto era diversidade, marcada por uma grande heterogeneidade entre os cursistas em vários aspectos, incluindo idade, experiência, domínio da tecnologia, conhecimento da língua ensinada e da metodologia de ensino. O que marca a diversidade e pode garantir um nível significativo de solidariedade não é a diferença baseada na quantidade, em que as pessoas que sabem mais ajudam as que sabem menos, sem possibilidade de trocar o que sabem. A solidariedade emerge mais facilmente na diferença baseada na qualidade, em que as pessoas sabem coisas diferentes e se ajudam no que sabem, trocando saberes. Quando a homogeneidade de um grupo aumenta diminui a solidariedade entre seus membros, tanto nos grupos fortes, em que supostamente todos sabem tudo, como nos grupos fracos, em que supostamente ninguém sabe nada; num caso e outro desaparece a necessidade da troca, seja pela abundância generalizada ou carência total de saberes disponíveis. Nossa experiência sugere que o prazer da autoria seria mínimo em grupos homogêneos fracos, aparentemente marcados pela desesperança generalizada de que o outro possa ter algo a oferecer. Quando a heterogeneidade é grande, surge uma espécie que magnetismo, unindo os membros do grupo de modo tão mais intenso quanto mais diversificado é o grupo, criando um desejo maior de compartilhar e colaborar.
Quadro 3 – Dez depoimentos sobre o prazer da descoberta do outro
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Fonte: os autores com base nos depoimentos dos cursistas
3.5 A descoberta do sucesso
O que o cursista produzia no curso eram atividades didáticas para serem compartilhas com os colegas, aplicadas com seus alunos ou alunos de seus colegas e distribuídas para um público planetário. Eram artefatos que, apesar de sua natureza virtual e justamente por serem assim, poderiam se instanciar concretamente em qualquer hora e lugar. Chegar a esse nível de impacto parecia produzir um senso de autorrealização, fruto de um desafio vencido, muitas vezes em colaboração com o outro. Vejam-se alguns depoimentos, conforme o Quadro 4.
Quadro 4 – Dez depoimentos sobre o prazer da descoberta do sucesso
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Fonte: os autores com base nos depoimentos dos cursistas
Houve também algumas críticas, reconhecidamente aceitas, principalmente em relação à instabilidade do ELO que, em algumas circunstâncias, não salvava o trabalho feito pelo participante. Veja-se o exemplo apresentado no quadro 5, que mostra alguns depoimentos de uma mesma cursista, recolhidos em sequência cronológica. Note-se a evolução para uma atitude mais positiva à medida que o curso avançava, mostrando uma reversão do que às vezes acontece num curso de formação continuada, iniciado com entusiasmo e concluído com decepção, quando não abandonado pela metade. Neste caso, vê-se o contrário: o que para esta cursista começou com “suor e lágrimas” parece ter terminado com entusiasmo e prazer.
Quadro 5 – Depoimentos críticos em relação à ferramenta
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Fonte: os autores com base nos depoimentos de uma cursista